REFORMA TRIBUTÁRIA: O QUE ALTERA PARA O SIMPLES NACIONAL?

Mudança na escolha de tributação e impactos comerciais para micro e pequenas empresas.

Reforma Tributária e o Simples Nacional

Se você é empresário optante pelo Simples Nacional, provavelmente acompanhou a Reforma Tributária com uma pergunta em mente: "O que será do meu regime?"

A Constituição Federal agora garante explicitamente que ele continuará sendo um regime diferenciado, simplificado e favorecido para micro e pequenas empresas. O famoso Documento de Arrecadação (DAS), que unifica diversos tributos, também foi preservado.

Isso é um alívio, pois evita um aumento súbito na burocracia para milhões de pequenos negócios.

Mas, se o regime não foi extinto, por que há tanta discussão?

Porque, apesar da manutenção da estrutura, uma mudança fundamental foi criada. E ela pode obrigar você a tomar a decisão estratégica mais importante dos últimos anos.

A Escolha entre Regime "Puro" e "Híbrido"

A grande novidade é que o Simples Nacional deixará de ser um caminho único. Com a chegada dos novos tributos (IBS e CBS), o empresário terá que escolher como irá recolhê-los:

  1. Regime "Puro" (Recolhimento "por dentro"): Neste modelo, tudo fica como hoje. A empresa continua pagando o IBS e a CBS de forma unificada dentro do DAS, com alíquotas reduzidas e progressivas. É a opção que preserva a máxima simplicidade operacional.
  2. Regime "Híbrido" (Recolhimento "por fora"): Aqui, a empresa opta por sair do Simples apenas para o IBS e a CBS. Ela passa a recolher esses dois tributos separadamente, seguindo as regras do regime normal (o sistema não cumulativo de débito e crédito). Os outros impostos (IRPJ, CSLL etc.) continuam no DAS.

Por que alguém escolheria o caminho mais complexo? A resposta está na "guerra dos créditos".

O Grande Desafio: Vender entre B2B ficou mais complicado

O coração do novo sistema de IVA é a não cumulatividade. Em termos simples: empresas que compram produtos ou serviços usam os impostos pagos nessa compra (créditos) para abater do imposto que elas devem pagar em suas próprias vendas.

E é aqui que mora o perigo para o Simples Nacional. Empresas grandes (Lucro Real ou Presumido) vão, mais do que nunca, buscar fornecedores que gerem o máximo de crédito possível.

  • Uma empresa no Regime Híbrido (ou no Regime Normal) gera crédito integral de IBS e CBS para seu cliente.
  • Uma empresa no Regime Puro do Simples só gera um crédito limitado, correspondente à pequena fatia de IBS/CBS dentro da sua alíquota unificada.

Qual é o resultado prático?

Mesmo que seu preço de venda seja o mesmo de um concorrente no regime híbrido, o seu produto ou serviço se torna efetivamente mais caro para o seu cliente B2B (pessoa jurídica), pois ele terá menos crédito para aproveitar.

Especialistas alertam que essa desvantagem pode criar uma diferença de preço final de até 20%.

Isso é grave. Estudos do setor, como o do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), apontam que mais de 70% das empresas do Simples Nacional não vendem apenas para o consumidor final. Elas estão em cadeias B2B e serão diretamente afetadas.

Essa nova realidade pode forçar uma escolha difícil:

  • Migrar para o complexo regime híbrido para gerar crédito integral e manter clientes.
  • Correr o risco de perder clientes corporativos para concorrentes maiores.
  • Ser forçado a se especializar apenas em vendas B2C (para o consumidor final), onde o crédito não importa.

Como Cada Setor Será Afetado?

O impacto não será igual para todos.

Setor de Comércio:

O impacto será dividido.

  • Varejo B2C (supermercados, padarias, lojas de roupa): Provavelmente se beneficiarão da simplicidade do Regime Puro, já que seus clientes não usam créditos.
  • Atacado e Distribuidores (B2B): Sofrerão a pressão máxima. Muito provavelmente, terão que migrar para o Regime Híbrido para sobreviver.

Setor de Serviços:

Este é, potencialmente, o setor mais vulnerável.

  • O principal custo dos serviços é a mão de obra (salários), e a folha de pagamento não gera créditos de IBS e CBS.
  • Prestadores de serviços B2B (consultorias, agências, empresas de TI) serão pressionados a adotar o regime híbrido. No entanto, ao fazerem isso, terão poucos créditos de insumos para abater, o que pode resultar em um aumento da sua própria carga tributária.

Setor de Indústria:

As pequenas indústrias podem ser as mais beneficiadas.

  • A atividade industrial, por natureza, tem uma longa cadeia de compra de matérias-primas, insumos, energia e máquinas. Tudo isso gerará créditos.
  • Ao optar pelo Regime Híbrido, a pequena indústria pode reduzir sua carga tributária efetiva e, ao mesmo tempo, tornar-se um fornecedor altamente atrativo na cadeia B2B.

O Imposto Seletivo (IS) é Sempre "Por Fora"

Para completar, a reforma criou o Imposto Seletivo (IS), o "imposto do pecado". Ele serve para desestimular o consumo de produtos prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente (como cigarros, bebidas alcoólicas etc.).

É crucial entender que o IS não está incluído no Simples Nacional. Se a sua empresa produz ou comercializa produtos sujeitos ao IS, você deverá pagar esse imposto além do seu DAS. Isso representa um aumento inevitável de custo e complexidade para esses segmentos.

O Simples Acabou? Não. A Gestão Mudou.

A Reforma Tributária não acabou com o Simples Nacional, mas enterrou a era em que ele era uma solução "passiva", onde o empresário pagava o DAS e não precisava se preocupar com mais nada.

Os desafios da complexidade e da nova pressão competitiva no B2B são reais.

O novo Simples exigirá uma postura de gestão fiscal ativa e estratégica. A transparência do novo sistema pode criar um ambiente de negócios mais justo, mas ele beneficiará as empresas que se adaptarem com mais inteligência e agilidade.